"Me vinguei de quem me chamava de feia, ficando linda" (Reflexão)

O título desse post é irônico, mas não achei uma frase melhor para isso 😂. Quem me acompanha há um tempo sabe que eu não gosto da minha adolescência. Inclusive já escrevi um poema sobre essa fase da minha vida. O pesadelo foi entre os 12 e os 16 anos.

A inspiração para esse texto surgiu porque eu estava observando os rumos que a minha vida tomou e os da dos meus colegas do colégio, em especial os que me diminuíam e faziam bullying comigo. Mais especificamente ainda uma pessoa desse grupo que foi um dos meus melhores amigos.

Voltando para as origens do blog/página, eu dizia que havia criado ela para compartilhar meus sentimentos, sejam eles bonitos ou feios, e acho que esse texto é sobre os feios. Vingança, narcisismo e satisfação por muitas vezes me enxergar melhor hoje em dia do que essas pessoas. O mundo dá voltas?

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Os traumas da puberdade

Ah, as espinhas... 😐

Tive uma infância razoável, me sentia querido, bonito, feliz e importante, mas quando a adolescência começou isso mudou. Tive a impressão que meus pais não gostavam que eu estava crescendo (não sei até que ponto isso era real ou era uma fantasia minha) e nem eu mesmo gostava. Me sentia prisioneiro também já que eles me proibiam de fazer tudo e isso acabou contribuindo para que eu acabasse crescendo muito impotente e inseguro. Isso me causava revolta.

Imagens exclusivas da minha
pele na adolescência.
(Imagem retirada da internet)

As mudanças que meu corpo passou durante a puberdade acabaram com minha autoestima e passei a sofrer bullying e deboches diversos na escola que contribuíram muito para isso também. Tive um surto de crescimento nessa época e meu corpo ficou estranho e meio desproporcional, além de eu ser muito magro. Minha pele ficou muito oleosa e tive acne, meu rosto parecia textura de pastel de feira 😞.

Eu não me vestia bem, utilizava roupas velhas usadas que eu ganhava da minha avó e de outros familiares porque meus pais não tinham condições de me comprar roupas da moda e isso também contribuía para o bullying.

Tenho sintomas de depressão desde criança e isso chegou a ser observado por algumas pessoas da minha família, como a minha falecida avó. Ela não sabia que era um problema de humor, um transtorno mental, mas ela conseguia perceber que havia algo de estranho em mim comparado a outras crianças da minha idade e frequentemente comentava isso com meus pais. Em muitos momentos eu era apático e desanimado demais para uma criança, mas ainda considero que tive uma infância feliz.

Esses problemas se intensificaram na adolescência porque além de eu ter essas fases de apatia e desânimo (ao ponto que algumas pessoas da escola e até professores me perguntavam porque eu era tão "devagar") eu também tinha uns surtos de mau-humor, raiva e irritabilidade. Nesses surtos eu brigava muito com meu irmão, de forma violenta e isso deixava minha mãe desesperada. Também quebrava coisas em casa porque não conseguia me controlar e eu gritava muito, tanto que eu tinha dores de cabeça por causa disso. Já fiz uma publicação no blog somente sobre isso: Depressão e Irritabilidade (Reflexão). A depressão pode se manifestar de muitas formas, nem sempre com tristeza profunda, às vezes é com raiva e mau-humor, principalmente em crianças e adolescentes.

Amizades tóxicas

Regina George - Meninas Malvadas/Mean Girls (2004)

Até mesmo amigos próximos que eu tinha nessa época me colocavam para baixo e é mais sobre eles que se trata esse texto.

Na quinta série do ensino fundamental fiz um amigo, vou chamá-lo de G. (ele não lê o meu blog, não nos falamos há quase 10 anos, mas evitarei dizer o nome dele mesmo assim). Ele se aproximou de mim porque eu me declarei para uma garota chamada Daniela e ela não me correspondeu, então comecei a chorar. Ele me viu chorando no fundo da sala e resolveu me consolar fazendo gracinhas (ele era uma pessoa bem engraçada).

Eu me considero bissexual e eu já tive paixões por meninas na infância, porém, eu não era apaixonado de verdade pela Daniela, acredito que chorei nesse momento mais porque foi difícil me declarar para alguém do que pela rejeição. Tanto é que comecei a chorar logo que me declarei, antes mesmo de ela me dizer sim ou não.

Pois, bem, me tornei amigo dele desde esse dia e fomos amigos muito próximos. Sentávamos um ao lado do outro na sala e conversávamos muito. BFFs 😂

Só que eu me sentia esvaziado nessa amizade. Ele se juntava com as outras pessoas para debochar de mim e em partes ele influenciava outras pessoas do nossos ciclo de amizade a debochar de mim também. Uma das coisas que ele fazia muito era falar que ia arranjar uma namorada para mim na hora do intervalo, então ele e outras pessoas me puxavam pela escola e perguntavam para todas as garotas se elas aceitariam namorar comigo. É óbvio que elas diziam não e isso gerava risadas como se eu fosse um palhaço.

Muitas vezes ele ameaçava que iria parar de falar comigo se eu não deixasse de ser estranho porque falava que era ruim para a reputação dele me ter como amigo. Ele também me diminuía muito, inclusive desdenhando até mesmo de coisas que eu me considerava bom.

Eu tinha que gostar das mesmas coisas que ele, ele desdenhava do que eu gostava. Era terminantemente proibido ter opiniões diferentes da dele também.

Por influência dele, passei a ser um aluno menos dedicado na escola, sendo que eu era um dos mais estudiosos. Minhas notas caíram um pouco. Sei que é um tanto injusto culpá-lo por isso já que as notas eram minhas e eu quem me deixei ser influenciado, mas a amizade tóxica que eu tinha com ele causou isso também.

Ele era muito bonito

Bem assim, com a diferença de que não eu não me sentia bonito nunca.

Ele era bem parecido com o Di Ferrero,
vocalista da banda Nx Zero.

O G. era um garoto muito bonito, ele parecia o Di Ferrero, vocalista da banda NX Zero, sempre falavam isso para ele, e ele tinha um estilo parecido utilizando roupas meio "emuxas" com muitos quadriculados e tênis da Vans. Enquanto eu parecia uma aberração da puberdade, ele tinha a pele lisa macia como um pêssego e também tinha o corpo proporcional bem bonito, levemente sarado porque ele já fazia academia na época.

Todas as pessoas do nosso ciclo de amigos da sala bajulavam ele dizendo que ele era bonito. Eu percebia que nem sempre essas opiniões eram sinceras, muitas vezes as pessoas bajulavam ele por causa desse comportamento de não aceitar que alguém discordasse dele, apesar de que ele de fato era bonito.

Desdenhando da minha possível homossexualidade

Dominik, protagonista homossexual do filme A Sala do Suicídio/Sala Samobójców (2011). Leia minha resenha sobre esse filme clicando aqui.

O G. era heterossexual, mas acredito que ele percebia que eu não era e também desdenhava e debochava disso. Muitas pessoas no colégio faziam bullying me chamando de gay, inclusive grupos de garotos até de outras turmas se organizavam para passar a mão no meu corpo sem meu consentimento, pegando no meu pênis ou no meu ânus pela roupa falando coisas como "você gosta, né?" e rindo. Isso fazia com que eu me sentisse humilhado.

Eu sempre gostei muito de música pop, um ritmo muito associado a homossexuais e LGBTQs, e também admirava muitas artistas mulheres, entre elas as cantoras Britney Spears e Rihanna. Ele debochava disso porque falava que não era coisa de macho. Eu não podia dizer que admirava essas cantoras, eu teria sempre de me referir a elas como gostosas e falar que eu comeria elas se pudesse, como se elas fossem pedaços de carne ambulantes.

Eu também andava muito com meninas da sala e ele ficava me incentivando a ficar dando em cima delas, coisa que eu não gostava.

Uma das coisas esquisitas é que eu ia muito na casa dele jogar vídeo game e lá, muitas vezes ele ficava exibindo o corpo e me mostrando o órgão genital em tom de brincadeira (???). Realmente nunca entendi isso, mas percebia que a maioria dos garotos naquela época, mesmo os que hoje são totalmente heterossexuais, tinham comportamentos meio homoeróticos como brincadeiras de ficarem se esfregando ou tocando um ao outro 😱

Me afastei

Ghosting é quando você se afasta bruscamente de alguém, simplesmente some.

Depois de alguns anos nessa relação tóxica, quando entramos no ensino médio as turmas foram modificadas. Os alunos mais novos permaneceram no período da manhã e os mais velhos foram para turmas no noturno. Eu era 1 ano mais novo que ele, então fiquei na manhã e ele à noite.

Ele chegou a tentar me encontrar algumas vezes indo na minha casa já que morávamos no mesmo condomínio. Eu não atendia a campainha, ficava sozinho em casa a tarde quando meus pais estavam trabalhando, então eu fechava as cortinas e desligava todas as luzes de forma que parecesse que não havia ninguém. Ele foi bem insistente por um tempo, acho que percebia que eu estava lá, mas não queria atender, só que com o tempo ele foi desistindo. Não evitei só ele, mas várias amizades tóxicas só que ele era meu amigo mais próximo.

Eu não sabia porque eu estava fazendo isso, foi algo sem pensar mesmo. Hoje em dia sei que é porque eu me sentia sufocado e esvaziado nessa relação e não queria mais ele nem várias outras pessoas por perto. Com o passar do tempo parei de cumprimentá-lo quando passava por ele na rua, quase como se ele fosse um desconhecido.

Isso que fiz hoje em dia é chamado de ghosting, que é quando você simplesmente some e passa a evitar alguém (amigo, rolo, etc).

Uns anos depois quando estávamos no terceiro ano do ensino médio, ficamos na mesma turma da aula de educação física. Na minha escola, os alunos do período noturno tinham aulas de educação física de manhã. No terceiro ano eu já estudava no período noturno também, mesmo que ele, mas em salas diferentes, porém, na aula de educação física caímos na mesma turma de novo.

Continuei agindo como se eu não conhecesse ele…

Até que um dia ele chegou em mim para perguntar porque eu tinha me afastado dele, disse que eu estava esquisito com ele. Eu disse que não me afastei, que só tinha ficado sem tempo porque nossas rotinas eram muito diferentes, a desculpa não colou.

Mais de 10 anos depois como estamos

Me considero bonito hoje em dia
e não me sinto mais rejeitado
como na adolescência.

Acho que o mundo deu muitas voltas de lá para cá. Primeiro que hoje em dia eu não sou rejeitado como eu era na adolescência. As pessoas não me veem como alguém cafona e sem estilo, muito pelo contrário. Desde os 17 anos passei a ser mais vaidoso e construí meu estilo, o que mantenho até hoje.

Também sou muito desejado sexual e afetivamente. Não que eu seja uma pessoa super requisitada, não é isso que quero dizer, mas eu sempre tenho muitos pretendentes sexuais e afetivos. Praticamente não sei o que é é não ter ninguém interessado em mim. Praticamente nunca tive de buscar pessoas interessadas, elas sempre vêm. Se eu fosse escolher alguma área da minha vida em que eu realmente tenho sorte eu diria que é essa. Na época da adolescência eu era visto como alguém inamorável de tão esquisito, nerd e desprezível, enquanto hoje fui descrito como apaixonante por vários garotos com quem já me relacionei.

Só que apesar de eu ter mudado tudo isso, ainda precisei de um bom tempo de terapia para desconstruir todo o estrago que essa adolescência causou em mim e na minha autoestima. Um bom tempo para entender que as coisas não são mais como eram, que as pessoas que me cercam hoje não me veem da mesma forma que meus colegas me viam na escola. E ainda tenho muitos resquícios, às vezes é doloroso ficar desenterrando esse passado.

Com o tratamento, fortaleci meu ego e hoje tenho uma boa autoestima. Fui diagnosticado com transtorno bipolar, diagnóstico bastante recorrente na minha família, e isso explica alguns problemas de humor e crises depressivas que apresento desde a infância, porém, estou em remissão.

Então esses dias eu me deparei com o perfil do G. no Facebook e fiquei bastante chocado em como ele não é mais tão bonito hoje em dia e como a vida dele não parece tão interessante e grandiosa quanto parecia na época.

Sei que hoje em dia ele deve ser outra pessoa e nem deve lembrar dessas coisas que causava em mim. Talvez hoje ele não me menosprezaria, nem me enxergaria como inferior ou como alguém que fosse prejudicar a reputação dele caso ele me tivesse como amigo, afinal já faz mais de 10 anos desde o fim da nossa amizade e ele era um adolescente, adolescentes são mais narcisistas e imaturos.

Só que confesso que dá sim uma massagem no ego ver que hoje em dia eu me enxergo como alguém mais bonito e interessante do que ele. Que sou vaidoso, me visto bem e sou desejado, relevante e importante para muitos. Todas essas coisas que ele dizia que eu não era.

Devo me culpar por me sentir assim? 👀