O primeiro conflito (Psicanálise) - filme Steven Universe

O primeiro conflito - Psicanálise
Spinel, nova vilã genocida apresentada no filme.
(Imagem retirada da internet, edição feita por mim)

Esse mês foi lançado mundialmente o primeiro longa-metragem do desenho animado Steven Universe (ou Steven Universo, como é chamada a versão brasileira) e gostei muito. Essa série sempre me desperta reflexões porque aborda temas bem profundos como luto, empatia, padrões e imposições sociais, amor, consequências dos nossos atos, etc. Mesmo se tratando de um desenho destinado ao público infantil. Com o filme não foi diferente e desde quando assisti, estou pensativo. Ao ponto que ele foi tema de uma das sessões com a minha psicóloga.

Nunca fiz análises muito profundas sobre Steven Universe, mas já publiquei aqui no blog uma teoria não confirmada dentro da fanbase de que as 4 diamantes seriam alusões às instâncias do aparelho psíquico segundo Freud (Id, Ego e Superego). Bem interessante, a título de curiosidade, porém, hoje vou um pouco além.

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O título deste post se chama "o primeiro conflito" não por acaso, mas, porque foi uma frase que proferi durante a sessão e teve um peso simbólico importante.


Antes de tudo vou resumir brevemente o enredo do filme e devo alertá-los que este texto contém spoilers (revelações do enredo), então, se você ainda não assistiu ao longa e não quer que a sua experiência seja afetada, recomendo que veja primeiro e retorne aqui depois. Vale ressaltar, também, que este filme é sequência das temporadas anteriores do desenho e os detalhes do enredo contemplam elas também.

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"Felizes para sempre"... Não, pera!

O primeiro conflito
(Imagem retirada da internet)

A história dá sequência aos eventos da quinta temporada, graças a Steven, o universo está livre da tirania das diamantes e seu império foi reformado. Então, as soberanas desejam que ele assuma o lugar de sua mãe, Pink Diamond, e governe ao lado delas.

O filme tem uma abertura visivelmente inspirada em contos de fada e nas animações clássicas da Disney. A trajetória de Steven é mostrada em um livro dourado com ilustrações sendo narrado pela White Diamond. Eles estão em uma cerimônia de posse para que ele assuma o trono, mas no momento do discurso de agradecimento, nosso garoto-híbrido recusa. Ele diz que quer apenas voltar para à Terra e viver feliz com seus amigos. Sua declaração é transmitida para todos os confins do império Gem.


Steven, então, retorna para seu planeta e segue com sua vidinha. Tudo parecia perfeito e ele queria que continuasse assim para sempre, até que uma figura misteriosa surge para acabar com sua paz. Uma gem com uma nave que parece uma seringa gigante com um veneno mortal que será injetado no planeta. Está pessoa enigmática aparentemente é mais alguém do passado de sua mãe. Ela também possui uma arma que parece uma foice e com ela consegue pufar Garnet, Ametyst e Pearl (pufar é quando uma gem é ferida ao ponto de perder seu corpo temporariamente). Ela também ataca Steven, mas ele consegue tomar a foice e utilizar contra ela, que também pufa.

O primeiro conflito
(Imagem retirada da internet)

Após esse conflito inicial, Steven tenta colocar a gema da vilã em uma bolha, mas percebe que seus poderes não estão funcionando como de costume e ele é incapaz de fazer isso. Gradualmente, suas amigas vão retornando as suas formas originais, mas sem memórias e com aparência diferente. Inclusive, a gem maligna que retorna com personalidade e visual doce e amigável, opostos ao aspeto que ela tinha antes deste acontecimento.

Diante disso, Steven descobre que a nova personagem se chama Spinel e que sua arma misteriosa, aparentemente reinicia as gems apagando suas memórias e fazendo com que elas retornem para seu "estado de fábrica". Ele também descobre que o veneno que a nave injetora está inserindo na Terra irá acabar com a vida do planeta dentro de algumas horas.

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O primeiro conflito (Psicanálise)
Spinel em sua forma original é inofensiva, doce e ingênua.
(Imagem retirada da internet)

Steven acaba tendo que lidar com uma missão quase impossível: recuperar a memória das suas amigas e recuperar a memória de Spinel para convencê-la a desligar a nave injetora, tudo em uma mesma tarde.

Para fazer isso, ele decide que precisa recriar momentos importantes da vida de cada uma. A estratégia dá certo e aos poucos todas vão voltando ao normal. Entretanto, para recuperar a memória de Spinel ele terá que ter contato com seu passado doloroso.

O terceiro que sobra

O primeiro conflito
(Imagem retirada da internet)

Descobrimos, então, que o passado de Spinel envolve uma história triste de rejeição, abandono e traição. A pequena gem, ainda em sua versão dócil, foi projetada para ser amiga de Pink Diamond que na época se sentia solitária em Homeworld. As duas viviam em um jardim construído especialmente para elas, porém, um dia a jovem diamante começou a ter aspirações maiores. Ela queria ter uma colônia dentro do império e as outras diamantes lhe deram a Terra.

Pink não correspondia aos sentimentos de Spinel, na verdade, se irritava bastante com seu jeito carente. Assim sendo, para simplesmente se livrar e deixar o jardim, ela mente dizendo que as duas vão fazer uma brincadeira e para isso Spinel precisa ficar parada esperando.


Como era de se esperar, a diamante jamais retornou, tampouco pretendia, e a pequena permaneceu no mesmo lugar por longos 6 mil anos. Durante este tempo ela se questionava se estava brincando certo, ou se tinha feito algo de errado. Até que em um belo dia, recebe a declaração de Steven na cerimônia de posse (do começo do filme) que havia sido transmitida para todo o império. Nesse momento, Spinel descobre que foi enganada todos esses anos, Pink não só a abandonou como teve toda uma vida sem ela e hoje não existe mais, tendo se transformado em Steven.

O primeiro conflito (Psicanálise)
Visual diabólico de Spinel. (Imagem retirada da internet)

Diante disso, Spinel tem sua aparência transformada. A pedra em formato de coração do seu peito vira de cabeça para baixo, seus coques em formato de coração se desfazem, suas ombreiras e sapatos se tornam pontudos, sua cor escurece, seu olhar muda e surgem marcas pretas em seu rosto que parecem um rímel borrado por lágrimas. Daí ela decide se vingar.

A revolta de Spinel vem do fato de que a pessoa que ela amava construiu uma vida sem ela. Teve uma história e fez novos amigos, enquanto ela estava abandonada no jardim. Spinel é a terceira que sobra na relação, além de ter sido feita de trouxa.


Música de apresentação de Spinel no filme revela um pouco de seus sentimentos.

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That's right I heard the story over and over again Gee, it's swell to finally meet her other friends That's right I heard the story, don't really like how it ends Gee, it's swell to finally meet her other friends
What did she say about me? What did she say? What did you do without me? What did you do? Did you play games without me? What did you play? Did you think all this time that I wouldn't find out about you?

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Tradução:

É isso mesmo, eu ouvi a história repetidamente
Puxa, é bom finalmente conhecer os outros amigos dela! É isso mesmo, eu ouvi a história, não gosto muito de como termina Puxa, é bom finalmente conhecer os outros amigos dela! O que ela disse sobre mim? O que ela disse? O que vocês fizeram sem mim? O que vocês fizeram? Vocês jogaram sem mim? O que vocês jogaram? Você pensou que durante esse tempo todo eu não descobriria sobre você?
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Contudo, o ponto mais interessante nisso tudo e o que me motivou a escrever este texto é que todos nós já fomos Spinel. O drama vivido pela personagem pode ser interpretado como uma alusão ao primeiro conflito vivido por todos nós na infância e que se repete ou nos assombra em diversos momentos da vida: o complexo de Édipo.

Durante essa fase do desenvolvimento psíquico infantil, a criança descobre que a sua mãe e seu pai possuem uma relação da qual ela não faz parte, ou seja, ela é o terceiro que sobra. Ela precisa encarar, também, a realidade de que sua mãe possui uma vida além dela e que esta pessoa que ela ama tanto não faz só o que ela gosta.


Pink Diamond tinha o desejo de ter uma colônia e este não incluía Spinel. Ela também fez novos amigos e construiu relações nas quais a pequena boba da corte novamente não fez parte. Em outras palavras, ela possuía uma vida inteira além da sua relação com Spinel.

Quantas vezes revivemos esse conflito em nossas vidas? Quando estamos apaixonados ou amando e precisamos nos dar conta de que não estamos incluídos em algum aspecto da vida da pessoa amada, ou pior, quando não estamos incluídos em nenhum? Assim como Spinel, nós nos sentimos inúteis e sem propósito. Ela foi criada para esta relação e muitas vezes nos enxergamos assim: alguém que foi criado para uma relação, incompletos sem uma.

Leia também:

A importância de preservar e não se acomodar

Psicanálise, o primeiro conflito
A nave injetora de Spinel envenenando o planeta.
(Imagem retirada da internet)

Outra reflexão muito interessante do filme diz respeito ao Steven e seu "felizes para sempre". No decorrer do longa, ele percebe que não existe nada assim. A felicidade é como uma plantinha que você tem que adubar e regar todos os dias. Se você se acomoda e esquece de cuidar, ela morre.

Aliás, a história da Spinel foi inspirada em um acontecimento de infância de Rebeca Sugar (criadora da série). Ela conta que quando era pequena esqueceu um coelinho de pelúcia no jardim e quando encontrou ele tempos depois, ele estava desbotado por causa do sol. Ela relata que parte disto está em Spinel, seu sentimento de culpa por ter sido negligente com o brinquedo.

Entrevista legendada em que ela comenta sobre isso.

Conclusão

Por algum motivo esses foram os pontos que mais me chamaram atenção nas reflexões propostas pelo filme. Eu sempre fico muito pensativo quando assisto esse desenho. Acho interessante como os conflitos e dilemas apresentados nele são universais, ou seja, são capazes de tocar crianças, adultos e pessoas com as mais diferentes vivências.

O que você achou das minhas reflexões? Existe alguma impressão que você teve diferente da minha ou algo que você queira acrescentar? Deixe nos comentários! 😍


Comentários

  1. Eu não conhecia, o que acho uma pena, pois me interessou muito. Pelas reflexões e os conflitos que não tem como não levar pra vida da gente.
    Estou numa fase que acho que seria uma boa assistir algo no estilo. Gostei muito da dica.

    bjs

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    1. Acho que você iria adorar o desenho, e as músicas são muito bonitas :3

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  2. Quando você falou em desenho, achei que seria mais voltado para o publico infantil, mas pelas suas reflexões, acho que esse desenho é mais para juniores...
    Enfim, como não conheço o desenho, vou ver se consigo me organizar e assistir. Caso consiga volto para opinar melhor...
    Parabéns pelo post, é nítido como você pesquisa e estuda, como você esta comprometido com o blog...
    Abraços

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    1. Eu acho que ele consegue atingir pessoas de diferentes idades, mas uma criança pequena não vai entender todos os dilemas propostos no desenho né

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  3. Oiii! Pra falar a verdade nunca havia ouvido falar neste filme, mas achei que vc trouxe abordagens muito interessantes , e até me deixou com vontade de assistir! A felicidade ser um sentimento que devemos saber manter e cuidar foi algo que me trouxe a tal universo cinematográfico! Taí uma boa pedida! Parabéns pelo post! Bjsss de uma linda semana!

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  4. OMG! Eu ainda não sabia que esse mês foi lançado mundialmente o primeiro longa-metragem do desenho animado Steven Universo! Confesso que eu gosto muito de assistir, apesar de não ter tido muito tempo no último ano, ou nesse, para colocar os episódios em dia. Super concordo, porque essa série costuma me despertar várias reflexões também. Já que aborda temas bem profundos como estes citados no seu texto. Acho de extrema importância que uma criança passe por essa etapa na vida dela, onde precisa encarar a realidade de que os pais possuem uma vida além dela, ou o fato dessas pessoas que ela ama, não viverem apenas para ela e para fazer o que vai agradá-la. Ou isso vai refletir na vida dela mais tarde de forma negativa. Acredito que um adulto infantilizado que não passou por esse processo na infância, possa se tornar abusivo. Por não compreender que uma possível companheira ou companheiro, tenha uma vida como individuo, que não apenas se limita a pessoa, cuja qual, é envolvida romanticamente em questão. Adoro os seus posts! E este está espetacular, como sempre.

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    1. Fico feliz que você tenha gostado, é realmente é uma questão difícil :3

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  5. Olá!


    Apesar de já ter ouvido falar desse desenho, eu não conhecia a sua história.
    Realmente não devemos achar que somos insubstituíveis ou que as pessoas que gostamos e amamos nos colocará sempre no topo de prioridades, isso nem sempre acontece, e acabamos nos decepcionando.
    Devo concordar que realmente temos que estar regando sempre a nossa felicidade, confesso que eu amei a forma que foi abordada.

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  6. Oi, tudo bem? Não conhecia mas achei o enredo bem interessante principalmente pelas reflexões que ele proporciona. Imagino o quanto deve ser difícil perceber que alguém que amamos construiu uma vida sem nós, enquanto parecemos que paramos no tempo. Isso acontece com muitas pessoas reais. Um abraço, Érika =^.^=

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  7. Eu amooooo tanto esse desenho aaaaaaaaa saudades me senti nostálgico, ♡♡♡

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  8. Olá, nunca vi esse desenho mas já gostei da forma que você o descreveu. Já quero assistir para refletir sobre o assunto também.

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  9. Não conhecia esse desenho, mas me chamou muito a atenção sua análise do mesmo, o que me despertou minha curiosidade, pois desejo fazer essa reflexão que ele nos transmite.

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  10. Minha filha de 6 anos ama este desenho, sabe toda a história e canta a música toda...

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