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Imagem de divulgação. |
Olá! Se você conhece um pouco de psicanálise ou está dentro do meio da psicologia, já deve estar ciente das acusações por parte de profissionais e estudantes de outras abordagens de que a psicanálise não seria científica, ou pior, que esta seria pseudocientífica. Há muito tempo eu quero falar sobre esse assunto, mas conforme comecei a estudá-lo a fundo, percebi o quanto esta questão é complexa e espinhosa.
Contudo, algumas vivências recentes e insights que tive na minha análise pessoal me inspiraram a tratar desse tema de um modo mais prático e até mesmo didático. Longe de querer fornecer uma resposta definitiva para esta questão, quero demonstrar o quanto esse debate é extenso e o quanto as acusações mais populares vistas principalmente nas redes sociais são frágeis. Quero também fazer algumas provocações e convites para reflexão, utilizando como exemplo a série sitcom de comédia The Good Place.
Atenção: o texto a seguir contém alguns spoilers do seriado!
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Contudo, algumas vivências recentes e insights que tive na minha análise pessoal me inspiraram a tratar desse tema de um modo mais prático e até mesmo didático. Longe de querer fornecer uma resposta definitiva para esta questão, quero demonstrar o quanto esse debate é extenso e o quanto as acusações mais populares vistas principalmente nas redes sociais são frágeis. Quero também fazer algumas provocações e convites para reflexão, utilizando como exemplo a série sitcom de comédia The Good Place.
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Primeiro de tudo precisamos compreender o que é conhecimento científico, porque ele é classificado dessa forma e sobre as diversas outras formas de conhecimento. De maneira resumida, conhecimento científico é todo aquele que é validado através de experimentação empírica e reproduzido nas mesmas condições por outros pesquisadores obtendo sempre os mesmos resultados. Para isso, se faz necessário o isolamento das variáveis do objeto estudado. Como exemplos de conhecimentos científicos podemos citar o formato da Terra, a existência da gravidade, a velocidade da luz, entre outros.
É importante esclarecer que, apesar de as pessoas acreditarem que as descobertas da ciência mudam com o tempo, é exatamente o contrário e exatamente isso que define seria um fato ou comprovação científica. Por exemplo, o formato da Terra é algo que já foi comprovado através de inúmeras pesquisas e imagens fotográficas, o formato da Terra não irá mudar, pelo menos não em um futuro próximo, e mesmo que ele venha a mudar, ainda se trata de um fato comprovado que um dia ela foi da forma como é hoje. Antigamente a ciência acreditava que a Terra era plana, porém, isso não era um dado comprovado cientificamente, era um dado intuitivo e em um período que a ciência ainda não havia amadurecido.
As questões científicas que mudam com o passar do tempo são as que ainda não são totalmente estabelecidas, seja por ser um tópico ainda em pesquisa, seja por limitações tecnológicas. Mesmo assim, as descobertas anteriores não são descartadas, elas são complementadas com as novas evidências. Portanto, é seguro afirmar que a Teoria da Evolução e a Teoria da Relatividade são verdades científicas bem estabelecidas. Isso significa que existem evidências suficientes no momento para se assumir que as premissas básicas de ambas as teorias são fatos comprovados.
Como surgiu o conhecimento científico?
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Imagem retirada do site Pixabay. |
O surgimento do conhecimento científico remonta ao período denominado antiguidade clássica que compreende a Grécia Antiga e o Império Romano aproximadamente entre o século VIII a.C. e V d.C.. Antigamente, as explicações para os mistérios da natureza vinham dos mitos e da religião, uma forma de conhecimento que é definida como sabedoria popular. Ao contrário do que muitas pessoas acreditam, esta não é uma forma de conhecimento irracional e desprovida de construções lógicas. As conclusões são assumidas com base na nossa intuição enquanto espécie humana e reproduzidas adiante através da cultura e das tradições. No entanto, a nossa intuição nem sempre está certa porque nós seres humanos somos bastante limitados em relação a nossas capacidades sensoriais. Por exemplo, assumir que a Terra é plana é uma constatação intuitiva, ao olhar para o horizonte nós não temos nenhuma pista de que as coisas, na verdade, são diferentes.
O período clássico é um momento da história humana caracterizado pelo seu valor máximo ser o antropocentrismo. Ou seja, naquela época valorizava-se muito o ser humano e as suas capacidades físicas e intelectuais, bem como o seu corpo e a sua anatomia. Por isso surgiram as Olimpíadas, as esculturas procuravam a fidelidade ao realismo e elas eram majoritariamente representações nuas do corpo humano.
Como consequência da valorização das nossas capacidades racionais, nasceu a filosofia. Esta disciplina buscava refletir sobre as questões do mundo a chegar a respostas lógicas e racionais na direção contrária das explicações intuitivas dos mitos e religiões. Ainda dentro da área da filosofia nasceu a ética, uma disciplina baseada na reflexão a cerca dos valores morais. Com o passar dos anos, surgiu a necessidade de verificar a validade de parte desses conhecimentos e então a ciência foi criada com esse objetivo.
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Imagem retirada do site Pixabay. |
É importante esclarecer, no entanto, que a ciência não substituiu o conhecimento filosófico, ela veio para preencher uma lacuna da qual esta forma de conhecimento não era suficiente. A partir disso, é importante considerar também que existem questões científicas e questões filosóficas. Ou seja, questões cuja resposta pode ser obtida através da experimentação científica e que existem questões que a ciência não comporta e devem ser alvo de apreciação filosófica. Uma dessas questões, acreditem vocês ou não, é a própria definição do que é ciência!
Todas essas considerações que eu trouxe mais acima não vieram prontas, elas foram sendo construídas no decorrer de séculos de discussões filosóficas a respeito da própria filosofia, da ciência e de classificar as mais diversas formas de conhecimento construídas pela humanidade. A área da filosofia encarregada de discutir e refletir sobre o que é ciência e diferenciar o conhecimento científico das outras formas de conhecimento e até mesmo classificar o que seria conhecimento pseudocientífico é a epistemologia, ou filosofia da ciência.
Dentre os filósofos mais importantes dessa área está Karl Popper, a figura mais citada nas discussões de internet quando procuram descreditar a psicanálise. O motivo? Popper foi um dos teóricos mais importantes a ajudar a construir a definição de método científico que acabei de descrever acima. Ele também foi crítico em relação a outros teóricos do mesmo período, entre eles Sigmund Freud na psicologia/psicanálise e Karl Marx na sociologia. Contudo, Popper tinha um conhecimento bem limitado a respeito de ambas as disciplinas e teorias, e o Prof. Christian Dunker psicanalista e docente do curso de psicologia da USP (Universidade de São Paulo) descreve em detalhes os porquês no video abaixo, com direito a citações diretas do próprio livro do Popper.
Imaginem vocês como seria a produção de um medicamento sem a experimentação científica. Um pesquisador testaria a eficácia de uma forma e comprovaria que funciona, outros testariam de outras formas e cada um chegaria a uma conclusão diferente. Não seria possível comparar os resultados desses testes porque cada um estaria adotando critérios e rigidez diferentes, as pesquisas simplesmente não chegariam a conclusão nenhuma! Associado a isso, existem questões da intuitividade humana que podem afetar os resultados das pesquisas, como o viés de confirmação, os efeitos placebo e nocebo e a nossa própria subjetividade como um todo.
O problema é que para outra grande parcela das disciplinas que se propõe científicas, o modelo popperiano não atende completamente. São as disciplinas pertencentes ao grupo chamado ciências humanas. Entre as principais podemos citar a sociologia, a economia, a antropologia, a linguística e até mesmo a história e a arte.
O motivo: todas essas áreas estudam objetos que são influenciados pelo comportamento humano e o ser humano é simplesmente o objeto de estudo mais complexo conhecido pela ciência. Sim, você enquanto ser humano é mais complexo que um buraco negro considerando todas as variáveis que influenciam a sua personalidade e comportamento. Entre elas podemos citar: história de vida, cultura, relação familiar, convívio social, genética e hereditariedade, hormônios, alimentação, e mais centenas de milhares ou até mesmo milhões ou bilhões de variáveis tornando o processo de isolar as variáveis do comportamento humano simplesmente impossível!
Por conta disso, as ciências humanas tem a peculiaridade de serem divididas em várias escolas de pensamento, ao invés de serem um todo coeso como nas ciências exatas e da natureza. Por exemplo, na psicologia nós temos a psicanálise, também temos o behaviorismo, o cognitivismo e a psicologia humanista. Na economia, por exemplo, temos a keynesiana, a marxista, a monetarista, entre outras. Muitas vezes, as próprias escolas possuem suas subdivisões internas. Na psicanálise nós temos a freudiana, a francesa, a psicologia do ego, entre outras. Sem contar as dissidentes como a psicologia analítica/complexa e a psicologia do poder. Cada uma dessas escolas se encarrega de um agrupamento de variáveis ou questões envolvendo o comportamento humano e a soma de todas forma os saberes da psicologia.
Devido a essas peculiaridades das ciências que estudam objetos influenciados pelo comportamento humano ou o próprio comportamento humano e que o modelo popperiano não atende as necessidades destas linhas de conhecimento, outros filósofos da ciência propuseram outros métodos científicos mais adequados a cada necessidade. Entre os métodos científicos mais famosos das ciências humanas estão o etnográfico e fenomenológico, e o materialismo histórico e dialético utilizados na sociologia, antropologia e outras ciências sociais, só para citar alguns exemplos! O interessante também é que algumas dessas correntes defendem até que uma ciência humana que siga o modelo popperiano é que está sendo uma pseudociência.
Conhecimento científico, conhecimento não-científico e conhecimento pseudocientífico
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Imagem retirada do site Pixabay. |
Como vimos acima, a definição de ciência não é algo tão rígido quanto as pessoas com pouco conhecimento a respeito do tema gostam de propagar na internet. São assuntos que ainda estão sendo discutidos dentro da academia e até hoje não surgiu uma única epistemologia que consiga atender todas as produções acadêmicas, principalmente relativas às humanidades.
Também é preciso fazer um parenteses sobre a diferença entre conhecimento não-científico e conhecimento pseudocientífico. Nem tudo que não é ciência é pseudociência. Podemos citar o próprio exemplo da filosofia, ela não é ciência nem se propõe a ser porque ela se encarrega de questões diferentes das questões científicas, portanto são duas formas de conhecimento que não substituem um ao outro. Aliás, a própria ciência é dependente da filosofia porque a resposta para o que é ciência e o que a diferencia das outras formas de conhecimento é uma questão filosófica.
Contudo, existem inúmeras outras produções de conhecimento não-científico que não são substituíveis pela ciência. Podemos citar o conhecimento histórico e o conhecimento artístico. Arte não é ciência, no entanto, a arte é inerente à humanidade. Todas essas classificações de conhecimento, seja artístico, histórico e filosófico não deixam de ser sérios e ter suas próprias formas de validação e estruturação ainda que não sejam formas de conhecimento científico.
Portanto, pseudocientífico não é o mesmo que não científico. Entende-se por pseudociência afirmações que pertencem à esfera da ciência e muitas vezes já foram refutadas, mas continuam a ser propagadas, por exemplo, o terraplanismo.
Quando uma pessoa afirma que a psicanálise não é uma ciência, é preciso entender de qual definição está pessoa está se apoiando e qual a definição de psicanálise também. Sim, porque a psicanálise é dividida em muitas escolas e existem, inclusive, escolas experimentais da psicanálise, como a neuropsicanálise cujo movimento possui a participação de figuras como o neurocientista António Damásio e o psicanalista Charles Brenner. Além disso, existe uma extensa bibliografia a respeito da epistemologia da psicanálise, praticamente todos os principais teóricos se debruçaram sobre o assunto.
O problema é que a imensa maioria dos acusadores mal sabe sobre esses debates a respeito da filosofia da ciência, quanto mais conhecer a profundidade e complexidade desse debate dentro da própria psicanálise. Não é raro falarem em tom pejorativo que psicanalistas se baseiam em um teórico centenário, demonstrando clara ignorância a respeito das diversões gerações de psicanalistas e do avanço da disciplina como um todo. Wilfred R. Bion é um exemplo de teórico psicanalista considerado contemporâneo.
Essas acusações também entregam os valores desse indivíduo, ou seja, a sua ideologia. Ao afirmarem que a psicanálise não é uma ciência em tom de crítica, estão assumindo que existe uma hierarquia de conhecimentos em que o científico se encontra como soberano. Essa ideologia é denominada cienticismo. Portanto, a filosofia não seria uma forma importante de conhecimento já que suas questões não podem ser validadas pela experimentação, tampouco os conhecimentos artísticos, históricos e até mesmo antropológicos, sociológicos, econômicos e linguísticos que tenham sido obtidos pelos diferentes métodos dessas disciplinas.
Isso acontece porque as divisões teóricas entre as escolas da psicologia vem de diferentes visões de mundo, de ser humano e até mesmo de ciência. A psicanálise não enxerga como conhecimentos úteis e válidos apenas os conhecimentos obtidos através da experimentação em laboratório, ela bebe da história, da antropologia, da linguística e da própria clínica. A psicanálise não acredita que os únicos objetos válidos de seres estudados são aqueles que podem ser mensurados através do tal método científico. No entanto, assim como não é qualquer coisa que pode ser considerado filosofia e não é qualquer coisa que é considerado arte, a psicanálise também possui suas próprias formas de estruturação e validação.
Se a psicanálise é ciência ou não é, depende de qual escola da filosofia da ciência você está se baseando. Contudo, se o conhecimento psicanalítico é útil, independentemente de sua classificação epistemológica, a resposta está na influência que as teorias psicanalíticas possuem na academia em diversas áreas do saber e da sua relevância.
Nem tudo que é terapêutico é científico, The Good Place
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Imagem de divulgação. |
Então chegamos finalmente na série The Good Place que eu quero utilizar como exemplo prático para todas essas questões. Já finalizada com quatro temporadas, superficialmente pode parecer uma série de comédia qualquer, mas é cheia de conceitos filosóficos super complexos.
A série é protagonizada por Eleanor, uma moça que morreu e foi parar no paraíso. Lá ela é recepcionado pelo arquiteto da vizinhança onde irá morar e ele explica que ela foi para o “lugar bom” devido a suas ações humanitárias louváveis na Terra. Ele também explica que ela morará na sua casa dos sonhos e com a sua alma gêmea.
O problema é, na verdade, Eleanor não teve uma vida dedicada a causas humanitárias, ela era uma pessoa bem mesquinha e egoísta e não reconhece nenhum dos feitos que estão atribuindo a ela. Outro detalhe muito esquisito é que a casa dos sonhos de Eleanor no lugar bom é decorada com fotos de palhaço que é uma coisa que ela odeia, além de não ter escada para subir um batente enorme de um cômodo a outro. Ela decide contar a verdade para sua alma gêmea, o professor de filosofia Chidi.
Agora Chidi está pressionado pelo dilema: será que o correto seria ele entregar Eleanor para a organização do lugar bom expondo que ela havia sido enviada para lá por engano? Ou será que ele deveria ajudá-la a se tornar um ser humano melhor a ensinando conceitos de filosofia e ética? Ele opta pela segunda opção, entretanto, começam a acontecer fenômenos esquisitos na vizinhança, desde aparecimento de girafas, chuvas de lixo e uma cratera gigante. Aparentemente todos os eventos estão relacionados a comportamentos de Eleanor.
Posteriormente descobrimos que Eleanor e Chidi não estão no paraíso, mas sim no inferno, ou lugar ruim, eles e mais dois moradores da vizinhança, Tahani e Jason. Tudo faz parte de uma pesquisa que visa desenvolver novos métodos de tortura para punir humanos que tiveram vidas ruins fazendo mal aos outros. Eleanor era mesquinha e egoísta, Chidi era tão obcecado por encontrar a resposta certa para tudo que tornou todas as pessoas ao seu redor infelizes, Tahani era muito vaidosa e só queria ser o centro das atenções e Jason não conseguia controlar seus vicios e impulsos. Esses quatro humanos foram cuidadosamente selecionados para que ao conviver, torturassem um ao outro.
Contudo, o experimento da errado e dentro de alguns meses, ao invés de se torturarem, o laço entre eles se fortalece e eles crescem como indivíduos. Além disso, Eleanor acaba descobrindo que eles na verdade estavam no Bad Place (lugar ruim). Michael, o arquiteto, então reinicia a memória de todos e tenta conduzir o experimento novamente fracassando centenas de vezes. Eleanor, Chidi, Tahani e Jason, então, precisam encontrar uma forma de escapar desse inferno psicológico e conseguir ir para o verdadeiro lugar bom, ou pelo menos um lugar médio.
O interessante é que a série é baseada fortemente em teorias filosóficas e cada arco é baseado em uma escola. Acontecem inúmeras reviravoltas no decorrer das quatro temporadas e somos confrontados com questões como: será que um paraíso realmente seria bom? e a eternidade? o que é a vida? o que é ético? existem almas gêmeas? Apesar de ser uma série de comédia hilária, ainda temos alguns momentos de drama que vão arrancar lágrimas dos mais rígidos corações.
Eu resolvi utilizar The Good Place como exemplo neste post por vários motivos. O experimento de Michael é um ilustração perfeita da complexidade e da impossibilidade que é isolar as variáveis do comportamento humano. Ele conduziu o experimento, mas falhou em prever como Eleanor, Chidi, Tahani e Jason iriam se comportar desde a primeira vez. Outra questão é que a série mostra a importância dos conhecimentos e reflexões filosóficas.
Ao assistir cada episódio eu passava o resto do dia pensativo. Eu tive vários insights enquanto assistia e levei muitos conteúdos da série para minha terapia. A grande questão é justamente esta, uma série de comédia siticom baseada em filosofia teve um efeito terapêutico em mim. Ao me deparar com todos aqueles dilemas e ver todas aquelas possíveis respostas, eu acabei por me tornar mais criativo para pensar a respeito dos dilemas da minha vida.
Isso exemplifica que existem coisas que podem produzir efeitos terapêuticos sem que estas sejam científicas, no sentido estrito do termo. Conhecimento filosófico foi terapêutico para mim, ainda que eu estivesse adquirindo através de uma série. Muitas vezes, produção artística é terapêutico para mim, por isso criei o blog, por isso escrevo, desenho ou invento coisas. Nenhuma dessas coisas é ciência, são filosofia e arte, respectivamente. Logo, porque supervalorizar tanto o que é científico em detrimento de tantas outras produções úteis?
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Imagem retirada da internet. |
Outra questão é que a série também demonstra alguns conceitos psicanalíticos. Existe uma personagem chamada Janet, ela é uma espécie de inteligência artificial personificada para auxiliar as pessoas no lugar bom (também existem Janets do lugar ruim e outros reinos). Ao conviver com os quatro protagonistas e ao ser reiniciada centenas de vezes, Janet começa a adquirir traços humanos e até mesmo se apaixona. Ela também lida com rejeição e ciúmes e começa a apresentar glitches que são uma alegoria para os sintomas de saúde mental provenientes de questões inconscientes mal resolvidas.
Ao ler o manual de fábrica da Janet, Michael encontra: “Janet pode apresentar esse tipo de falha por não estar apresentando a verdade objetiva”, ou seja, Janet estava apresentando sintomas porque ela estava mentindo para si mesma sobre não estar sofrendo por ver o garoto ao qual ela se apaixonou com outra pessoa.
A série flerta com conceitos psicanalíticos também ao exemplificar como o relacionamento interpessoal e laços afetivos são capazes de impulsionar as pessoas para o crescimento. Os quatro protagonistas eram pessoas presas em suas questões, mas ao criarem laços uns com os outros, acabaram crescendo em conjunto. Essa a base da psicanálise ou psicoterapia psicanalítica, a dinâmica da relação terapêutica entre o analista e o analisando que estimula o paciente a enfrentar suas questões e crescer.
Finalizando
Espero que estas minhas reflexões tenham ajudado vocês a compreenderem a complexidade desse debate o quanto ele é empobrecido nas discussões rasas das redes sociais. Atualmente existem inúmeras pesquisas de eficácia sobre tratamentos psicanalíticos, já até publiquei aqui no blog, mas a visão da psicanálise acerca do que é terapêutico não engloba apenas estes aspectos mensuráveis através do método científico.Desejo que eu também tenha instigado vocês a questionarem a ideologia cientificista tão forte na nossa sociedade contemporânea e enxergarem o valor de outras formas de conhecimento. Não é porque uma coisa é não-científica que automaticamente ela se torna descartável, inútil ou que ela não possui seriedade.
E comente abaixo se você já assistiu The Good Place e o que você achou de todos esses devaneios fiolosóficos, vou adorar ler! 😊
Referências
- BEER, Paulo. Psicanálise e Ciência: um Debate Necessário. 1. ed. São Paulo: Blucher, 2017.
- GAMBOA, Silvio Sanchez. Quantidade-qualidade:: para além de um dualismo técnico e de uma dicotomia epistemológica. In: Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. 8. ed. São Paulo: Cortez Editora, 2013. cap. 3, p. 83-106.
- ATKISON, Sam et al, (ed.). O livro da filosofia: As grandes ideias de todos os tempos. 1. ed. Porto Alegre: Globo Livros, 2010.
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